quinta-feira, 23 de julho de 2020

Acolhida de Aula - Semana de 10 de julho de 2020

Bom dia, pessoal! Tudo bem por aí? 

Como estão hoje, essa semana, esse mês? Sei que tem sido difícil para todos, em diferentes escalas e significados. Aqui também as coisas oscilam muito, e mesmo tentando focar no que há de bom, uma hora você tropeça. Mas tem que se levantar em seguida.

Uma coisa para pensar é o processo. O conjunto de questões que estão envolvidas no desenvolvimento de qualquer projeto. Vou falar focado em projetos de arte, mas sei lá, talvez valha pra outras coisas da "vida real".
A percepção de que "é fácil" fazer alguma coisa é muito enganosa. 

Tudo que você faz com facilidade (física, motora, mental, emocional) é resultado de todo preparo prévio que você já teve, não necessariamente consciente. Saber lidar com etapas de trabalho significa que você já dominou o suficiente daquele conjunto de habilidades para chegar ao ponto de nem pensar naquilo. É o que sempre falo sobre a interiorização das coisas, transformar em instinto algo que, no começo, era super complexo e técnico.  

comparação que sempre faço com dirigir um veículo ou tocar um instrumento musical é válida. Começa complicado, vai ficando fácil e logo começa a ser transformada em "linguagem", algo que não só você "só faz", como faz do "seu jeito".

Todo projeto, todo trabalho artístico, leva tempo e dedicação. Pode ser um desenho no caderno, pode ser uma graphic novel de 200 páginas. Cada coisa leva seu tempo, e esse tempo é relativo a cada pessoa/artista. Esse tempo pode ser decomposto em etapas, e dessas, cada uma tem sua duração e dificuldade. Chegar num ponto em que você tem proficiência e tranquilidade para desenvolver cada um das etapas não significa que você vai conseguir fazer tudo em velocidade acelerada. A velocidade não significa qualidade. Como eu disse, também, cada etapa tem sua exigência e, por consequência, uma duração específica. 

A falta de experiência/vivência nesses projetos acaba nos enganando quanto à estimativa de quanto tempo e quão difícil é cada etapa. Quantas vezes eu já não vi autores jovens, artistas em formação, querendo produzir uma HQ curta e tendo uma dificuldade extrema? Ou mesmo fazer uma série de 4, 5 ilustrações e tendo a mesma dificuldade? Talvez até tentando fazer uma arte usando técnicas ou processos que não conhece bem ou domina e se perdendo no caminho?


O que acontece muito (em projetos longos, especialmente) é um desânimo se apoderar de nós quando chegamos no tal "point of no return": o ponto do trajeto onde você já foi longe demais para voltar atrás e ainda longe demais de terminar. Nesse ponto, você pode simplesmente desistir, e não voltar atrás.  

Um projeto de arte não é uma trilha na montanha, você pode parar naquele ponto. Vai ter os resultados do que já fez até então, mas não vai ter o conjunto pronto. Paciência. Aprenda com a experiência, com os processos, use tudo que tirar de positivo disso para te fortalecer e te preparar para a próxima jornada (porque não só vai haver mais, TEM que haver mais).

A jornada pode nos desafiar demais, e quanto mais longa, mais provável será de encontrar um momento de desânimo. Acontece com todo mundo, eu acredito, por melhor que seja sua situação: a grana está OK, o tempo também, a vontade de fazer, a vida social... Em algum momento você vai estar cansado e vai questionar os porquês de tudo. E quando a situação tem elementos que não são favoráveis, piora. aumentam os questionamentos. 

Essa "barriga" de meio de projeto é complicada. É um momento de respirar, confiar em tudo que você já fez e continuar fazendo, mesmo com o rendimento baixo e as dúvidas em torno de tudo. Existe um momento da produção, acredito, que você já passou dos momentos de criatividade extrema (não se enganem, essas etapas exigem MUITO de nós, mesmo sendo mais "internas"), mas ainda não chegou na etapa mais "mecânica" (onde você até pode mandar um podcast ou seriado enquanto vai resolvendo as coisas). 

Para mim, esse momento é a arte-final e as cores. É uma mistura de criativo com mecânico, e tem momentos em que, mesmo finalizando 3, 4 páginas por dia, eu sinto que é insatisfatório: demora muito para ver quantidade de resultados, não traz tanto prazer criativo... É o ponto, nos meus trabalhos, onde já trilhei caminhos demais para parar, mas ainda estou longe de chegar ao ponto final.

Resiliência e paciência. Passar por cima do desânimo. Focar sua energia em algo que não seja tão complicado de resolver (tipo um trecho de cenário manchado, silhuetas, etc) pode te empolgar para fazer as coisas mais elaboradas e exigentes, e quando você chegar nelas, vai estar mais apto a resolver bem a questão. Eu já fiz projetos longos, médios, curtos. Todos eles exigem resiliência. 

Fazer arte, quadrinhos, ilustração, aqui, especialmente nesse momento de instabilidade em quase tudo, é um ato de resistência. Mas temos que pensar que, a não ser que encaremos o processo todo, em todos seus momentos, em um misto de respeito a nós mesmos e ao projeto em si, não teremos nada terminado para mostrar. Só etapas. E etapas são suficientes apenas para nosso próprio aprendizado, e não para portfolio nem publicação. Eu sei que todo projeto que você conclui te dá um misto louco de sentimentos. Pode até ser que você não ache que é 100% o que queria ou que demonstre tudo que você sabe, mas ainda assim, está terminado. Lembra do Jake Parker: feito, não perfeito (finished, not perfect)?

E não estar 100% satisfeito é até bom, no final das contas, pois mostra que podemos evoluir e queremos melhorar. É só não deixar que essa sensação cause um efeito retroativo ruim, de te desencorajar a começar as coisas ou encarar algo mais trabalhoso só pela "certeza" de que não vai chegar onde queria (expectativas muito altas, talvez?). Ninguém melhora, evoluiu e domina os processos ficando parado com medo de resultados. 

Tem que botar as coisas pra funcionar, fazer, fazer e fazer muito mais. Fazer até cansar, fazer e mostrar, publicar, mesmo que não seja exatamente o seu melhor, mas é o melhor que você pôde fazer. Com o tempo, como disse, essa coisa vai nivelando para que mesmo seu trabalho feito com 40, 50, 60% da sua habilidade ainda é bacana e válido.

Bom, é isso aí. Bola pra frente, toca o barco, segue o baile.

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